sexta-feira, 6 de abril de 2012

La estación


E todos os dias aos abrir os olhos, ela se  preparava para as mesmas coisas;  entrar no banho, tomar café, escovar os dentes, colocar a roupa, pegar o ônibus, ir trabalhar, almoçar, trabalhar de novo, voltar pra casa, se lamentar que estava cansada e não ter mais tempo pra fazer nada, dormir...

Todo dia a mesma coisa, e os mesmos pensamentos, que não deveria ser assim, que precisava se organizar melhor pra fazer coisas que a animassem mais. Mas quando se está em meio a uma rotina tão desinteressante, até os pensamentos se tornam os mesmos. Ela ainda desejava coisas diferentes, mas talvez pra evitar novas frustrações, já não tinha muita vontade de tentar.

A rotina era o local que mais a perturbava, tudo igual sempre, mas ao mesmo tempo era onde se sentia segura. Ver os mesmos rostos, esperar as mesmas reações, sentir os mesmos gostos, ver as mesmas cores...

Um dia algo aconteceu, ela se levantou como todos os dias, se arrumou como todos os dias, saiu pra trabalhar como todos os dias, mas não sentia mais vontade daquilo, queria realmente algo diferente, que ainda a emocionasse, causasse surpresas, e a fizesse sentir vontade. Algo que fizesse algum sentido.

Tomou uma decisão. Olhou sua conta bancaria, procurou algum lugar que parecia precisar de sua ajuda e sonhou com uma vida nova. Em três dias, com a passagem de ida nas mãos, pediu demissão, arrumou as malas e escreveu um bilhete avisando a quem quisesse saber, que ela passaria um tempo fora, em busca de outras coisas, em busca dela mesma.

Próximo à hora do embarque ela já estava no aeroporto, e de repente começou a se condenar por ser impulsiva, estava incerta por deixar o pouco que julgava ter, e que nesse momento percebeu ser bem mais do que teria a partir de agora. Quis voltar atrás, mas não tinha como, não podia.

Chorou, não por estar triste, mas por ser difícil tomar uma decisão assim, por não se lembrar dos motivos que a fizeram ir embora, ou por estes parecerem tão bobos agora. Poderia ter feito outras mudanças, menos radicais. Mas não ainda sim não estava triste. Trazia as lembranças de seus dias, como uma impressão ruim, mas sem lembrar-se de fatos ou pessoas importantes.

E se alguém fosse atrás dela? Quem sabe não fosse o fim da linha, quem sabe ela nem pegasse esse avião.

Absorta em seus pensamentos ouviu de longe a chamada do vôo, não viu ninguém por ali que quisesse a impedir de ir embora. Então, sem mais o que esperar ou fazer ali, pegou suas malas e embarcou.


*Inspirado livremente na Música "La estación" (Herbert Vianna) - Paralamas do Sucessso
Link para a letra: http://letras.terra.com.br/os-paralamas-do-sucesso/71418/